sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

CERÂMICA - RECEPTÁCULO DE SONHOS -Exposição Na Galeria Candido Mendes - 2006

Passei o ano de 2005 principalmente fazendo peças para a exposição individual que viria a realizar na Galeria Candido Mendes de Ipanema em 2006. Embora até aquela data já tivesse feito várias individuais, esta seria a segunda somente de cerâmica (a outra acontecera em 1995 na Galeria SESC da Tijuca). Por este motivo eu queria mostrar um conjunto de peças bastante variado, mas que tivesse uma unidade, coisa que não é muito fácil de se conseguir. Sendo assim, parti para uma revisão dos meus trabalhos anteriores, estudando-lhes as formas e decoração com engobe afim de encontrar entre eles os resultados que fossem mais interessantes, recriando-os com novos "toques", de forma que se tornassem também peças originais e tão expressivas quanto as antigas.

Nesta prática, desenvolvi 60 novas peças, porém para a exposição levei, se não me engano, a metade ou pouco mais. Para a escolha dos trabalhos fui ajudado pela curadora do espaço, a Graça, e para a montagem obtive ótimas sugestões de um expert no assunto, que muito me auxiliou a tornar a exposição visualmente muito dinâmica e atrativa. Considero esta exposição umas das melhores que já fiz em minha carreira. Ela se chamou: "Cerâmica - Receptáculo de Sonhos" e aconteceu entre 31/10 e 21/11 de 2006 na Galeria do Centro Cultural Candido Mendes em Ipanema (RJ).

Seguem algumas imagens das peças desta exposição:



















Todas as peças mostradas acima tem entre 35 e 55 cm de altura, foram modeladas através de sobreposição de tiras de argila, sua decoração foi feita com engobe e a queima se realizou a 1000° C.

Imagens da Exposição Motada:

Aspecto da primeira montagem.



Aspecto a montagem definitiva - parte central da exposição.



Diversos ângulos da exposição:



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Convite da Exposição:
Todas as peças mostradas acima foram modeladas através de sobreposição de tiras de argila, sua decoração foi feita com engobe e a queima se realizou a 1000° C.
*fotos de Maria Sá
Texto de Apresentação da Exposição:

CERÂMICA – RECEPTÁCULO DE SONHOS

O vaso – a forma mais antiga e tradicional relacionada à arte da cerâmica – este é o objeto principal do meu trabalho como ceramista, contudo sem a ênfase em sua função meramente utilitária, e sim criado para ser visto como objeto de arte. Por isso, meus vasos não são simétricos, são tortos, sinuosos como cobras, às vezes possuindo barrigas de mulheres grávidas ou a aparência de delgadas bailarinas. Alguns são amassados, rudes, emendados, lembrando paredes rochosas de encostas ou de cavernas viradas ao avesso. Podem escancarar bocarras ou expor bocas mínimas, totalmente desproporcionais ao resto do corpo. Outros são como botijas antigas ou torres inclinadas aparentemente prestes a ruir. E embora neles, como vasos que são, ainda esteja presente algo de sua função original, seu verdadeiro objetivo é o de serem receptáculos do mistério, do sonho e da fantasia.

Mas se na forma meus vasos são bastante livres, influências diversas são visíveis na decoração policromada que lhes ornamenta a superfície. Provêm das artes étnicas, de culturas ancestrais, da arte rupestre e da arte popular – é um pouco de tudo, muito misturado e acrescido dos elementos de minha própria imaginação. São geometrias soltas e coloridas, algumas gravadas e incrustadas de branco; volutas barrocas, de tamanhos variados; encontros entre texturas ásperas e polidas; pastas arenosas como superfícies de barrancos, recobertas por esguios desenhos. Figuras antropomórficas, de tipologias diversas, recobrem algumas peças, exemplos do imaginário que cruza o gênero humano com seres de pura fantasia; já outras são de bichos conhecidos ou exóticos. E as bonecas - casamento entre o vaso e a figura humana – são, talvez, o tipo mais próximo da arte popular entre os seres de minha criação.Tudo geralmente muito colorido, um tanto rústico, mas bastante espontâneo e alegre. Portanto, não faço cópias de exemplos da arte étnica, apenas olho, me encanto e, intuitivamente, desenvolvo minhas interpretações, encontrando um resultado que tem algo da magia ancestral, instigante e ao mesmo tempo original, pessoal e, contudo, universal.

Para modelar meus vasos dispenso o torno; prefiro utilizar uma variante da técnica dos roletes sobrepostos: as tiras sobrepostas. Vem daí a espessura finíssima destes trabalhos, quase uma casquinha, o que lhes proporciona real leveza. A queima é realizada durante cinco horas em forno elétrico, a 1000º C, o que também fixa a policromia feita com engobe aplicado a pincel (o engobe é uma tinta para cerâmica que tem argila como aglutinante e pigmentos minerais como colorantes). Algumas vezes faço gravações (ou “esgrafitos”), que são incrustadas com engobe branco, bem espesso, e posteriormente raspadas ou, então, preenchidas, após a queima, com uma pasta de cera branca. Este procedimento realça muito o aspecto gráfico da decoração, derivado de minha experiência como gravador.

Pois, enfim, os meus vasos somam em si algo das artes que pratico - um pouco da minha pintura, da minha xilogravura, tudo misturado no contexto da cerâmica. E mais do que isso: me permitem sonhar trabalhando - o que é muito bom.


Ricardo Pereira