quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

As Primeiras bonecas "Cabeça-de-Pastel"

Lá por volta de 1988, ainda antes de começar a trabalhar em sociedade com o San, estava eu no ap que dividia então com a Bete, procurando criar em cerâmica uma figura feminina que tivesse relação com as Vênus Rupestres, criadas por nossos ancestrais da Pré-História. A primeira tentativa, infelizmente perdida e não fotografada, não me satifez. Depois de muito buscar, resolvi tentar uma forma que unisse o vaso à forma feminina e de experiência em experência cheguei àquele tipo que chamo atualmente de "boneca cabeça-de-pastel". O porquê deste nome ficará claro nas postagens abaixo:

Aqui aparece a primeira boneca cabeça-de-pastel, entre dois vasinhos com tema figurativo.

A Primeira, sozinha em toda sua simplicidade e primitivismo. Muitas outras iriam sair desta feliz experiência.

Estas, também do final dos 80, são muito curiosas com seus seios à mostra e seus "cabelos-barba".

A do meio têm, além dos outros atributos, sombras ao redor dos olhos e bochechas rosadas.

Temas Figurativos

Ainda continuando a exposição destes pequenos vasos do final dos anos 80, vou postar agora imagens de peças com temas figurativos, derivados diretamente das minhas pinturas de cavalete criadas nesta mesma ocasião (ver meu blog sobre pintura e xilo: http://ricardarte.blogspot.com). São figurinhas simples, que lembram desenhos infantis ou arte rupestre, todas bastante coloridas. Os vasinhos são muito simples e rústicos, mas estão em acordo com a pintura aplicada neles.








terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Ainda os Pequenos Vasos - 1988/89

Aí estão mais alguns dos meus pequenos vasos pintados com engobe, todos assimétricos, alguns polidos e esgrafitados, outros com desenhos coloridos, com boca larga ou minúscula (tipo garrafa). Foi uma produção muito variada, naquela passagem de 88 para 89, no meu ap e principalmente no atelier do San. Estas peças despertavam muito interesse, tanto do público que frequentava o atelier quanto nas lojas aonde eu as vendia, todas na Zona Sul (Gávea, Leblon, Ipanema, S. Conrado). Infelizmente nenhuma daquelas lojas existe mais.













































As peças mais brilhantes dos conjuntos apresentados acima, receberam sobre sua camada de engobe, antes da queima e no "ponto de couro" (quando a secagem não está completa mas a argila já perdeu sua maleabilidade), um polimento aplicado com uma colher de alumínio. Os desenhos foram gravados na superfície com um instrumento pontiagudo e metálico. Atualmente, quando faço estes polimentos, prefiro utilizar pedras semipreciosas como a ágata ou outros tipos que tenham suas superfícies bastante lisas e arredondadas.

Os desenhos aplicados variam muito, indo de temas inspirados em arte africana ou pré-colombiana, passando por temas populares até abstrações completas.

Em relação às formas, minha intenção principal era desenvolver um jogo, uma brincadeira, a partir do utilitário. São garrafas com alças minúsculas que nada podem conter; vasos gordos, tortos, amassados, inclinados. O que é atraente nestas peças, além do seu colorido e dos seus desenhos, é justamente este ar de estranheza que possuem, principalmente quando colocadas em destaque numa estante.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Trabalho em Sociedade

Em 1985, praticamente havia concluído o curso de pintura da EBA, restando apenas cursar algumas disciplinas complementares para poder me formar. Por esta época comecei a trabalhar em restauração de obras de arte, para conseguir algum dinheiro, inicialmente num estágio remunerado no Museu da República e depois como contratado em outros empreendimentos nesta área (até hoje trabalho, eventualmente, nesta área, sozinho, com minha esposa ou em equipe).

Por não estar mais frequentando a EBA diariamente, não pude mais trabalhar na sua Oficina de Cerâmica, que nesta ocasião passava por reformulações, com a aposentadoria da antiga professora Geni. Por este motivo fiquei uns três anos sem modelar qualquer peça, me dedicando apenas a concluir o curso de Pintura, ganhar "algum" como restaurador e, principalmente, a pintar meus quadros e fazer minhas xilos, agora no "ap" que alugara com minha futura esposa, a Bete (também formada na EBA e totalmente dedicada à restauração).

Mas em 98 comecei a sentir uma "coceira" nas mãos pela falta de contato com a argila; por este motivo comprei mais barro e voltei a modelar. Inicialmente fiz pequenas peças coloridas com engobe, mas o problema era aonde queima-las, já que o forno da EBA não era mais facilmente acessível para mim. Foi quando um antigo colega me apresentou a um ceramista japonês, conhecido como San, dono de um atelier em Laranjeiras (RJ), que poderia queimar as minhas peças.

Isto foi ótimo, e lá fui eu com meus vasinhos coloridos, de carona com meu pai, que me ajudava muito, inclusive carregando minhas bugingangas em seu carro quando tinha um tempo disponível (fundamental personagem em minha vida, o Dr. Ermenegildo, nunca o homenagearei o suficiente). Chegando lá, o San, muito solícito, aceitou imediatamente incluir minhas peças em suas queimas de biscoito e, a partir deste contato, surgiu uma forte amizade (temperada com alguns desentendimentos) que durou até seu retorno ao Japão em 1992.

Em breve me tornava sócio do San. Então, entre 1988 e 1991, trabalhei em seu atelier, trocando informações, dando minhas primeiras aulas, dividindo despesas e passando por inúmeras experi ências muito curiosas, entre elas a de criar peças a quatro mãos, tanto com o San quanto com o Henrique, um músico-ceramista, que também frequentava o atelier.

Para ilustrar o início desta história, vou postar alguns exemplos dos trabalhos que fazia então, por volta de 88, 89 e 90. Acredito que alguns destes vasinhos estão entre os primeiros que queimei no forno so San.
















Todas estas peças foram modeladas com uma variação da técnica dos "cordões", são coloridas com engobe (espécie de tinta para cerâmica, feita com argila branca - barbotina - e pigmentos minerais ou "BVs" - baixos-vidrados; a aplicação é a pincel e a queima é de baixa temperatura, de 800° a 1.000° C) e recebem acabamento a frio, feito com verniz vinílico e camada final com cera polida.

O estilo de sua decoração e suas formas demonstram a influência das artes "ancestrais" (étnicas, "primitivas", rupestres etc.) que então eram a fonte de inspiração para meus trabalhos de uma mneira geral, fossem eles de pintura, xilo ou cerâmica (sobre este tema ver a postagem mais recente do meu outro blog: http://ricardarte.blogspot.com) .

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Primeiros Vasos Pintados com Engobe (84/85/86)

"Vaso Azul Texturizado" - Cerâmica colorida com engobe, 900° c, alt.: 23 cm, 1986. Neste exemplar, apliquei um desenho geométrico rústico sobre a camada de engobe.


"Jarra-Boquinha" - cerâmica colorida com engobe, 900° C, alt.; 50 cm,1985. Aqui está um dos primeiros exemplares de vasos pintados com engobe, ainda na EBA. É um "utilitário-não-utilitário"

"Jarra-Boquinha" - detalhe.

"Vaso da Terra"- cerâmica colorida com engobe, 900° C, alt.: 30 cm, 1985. Gosto muito da forma desta peça, que lembra uma lata levemente amassada, e das suas listas coloridas em tom terroso, que são as cores de uma camisa que minha namorada de então (agora esposa) usava de vez em quando.

"Vaso Amassado com Borda" - cerâmica colorida com engobe, 900° c, alt.: 25 cm,1985. Neste exemplar gravei um rendilhado barroco, mas o forte da peça é mesmo a sua total assimetria, como se o vaso estivesse para se desmanchar.

"Vaso Amassado com Borda" - detalhe



Ainda na Oficina de Cerâmica da EBA, comecei a criar vasos coloridos com engobe. No início eram pinturas simples, na maioria faixas coloridas com duas cores, às vezes com uma aplicação a frio de cera levemente pigmentada, processo que eu trouxera da minha pintura sobre tela. Os vasos deste período já tinha paredes muito finas e formas simples e assimétricas, modeladas com tiras de argila, um desenvolvimento do processo dos roletes.

Ainda na EBA

"Vaso Boca de Verme" (ou "Fálico") - cerâmica queimada em baixa temperatura, alt.: 80cm, 1983. Esta é uma peça bem na fronteira entre as primeiras, com temas fantaisosos, e as que passei a fazer posteriormente, mais centradas na forma. Foi modelada na técnica dos roletes.

"Vaso-Placa"- cerâmica esmaltada em baixa temperatura, alt.: 25 cm, 1983. Aqui a preocupação é principalmente com a forma, mesmo que a textura aplicada assim como esmalte lembrem elementos "orgânicos".

"Vaso-Garrafa"- cerâmica colorida com engobe, alt.: 35 cm, 1984. Um dos meus primeiros vasos deste tipo, em versão esmaltada.

"Vaos-Garrafa com Tampa"- cerâmica de baixa temperatura, alt.: 48 cm, 1985. Neste trabalho começava a se evidenciar o meu interesse em agregar elementos gravados na superfície das peças, neste caso um suave rendilhado em forma de escamas. Há aqui também um toque de humor, que já existia um pouco nas peças anteriores, a partir da idéia do "utilitário- não-utilitário". Trabalho com este tema até hoje em várias das minhas peças.


"Vaso Boca Larga"- cerâmica esmaltada em baixa temperatura, 1984. Este é um exemplo da minha preocupação apenas com a forma e com a leveza da peça, tanto visual quanto real. As paredes deste vaso são muito delgadas, fruto de um aperfeiçoamento da técnica dos roletes, que pratico até hoje.



Aos poucos fui deixando de lado os temas literários e me voltando mais para as questões da forma pura. Descobri que o simples "vaso" poderei ser explorado de inúmeras maneiras, tanto do ponto de vista de sua forma quanto em relação à decoração.

Como a técnica dos roletes se presta muito para a modelagem de vasos, criei vários deles neste processo. No início eles eram grossos e pesadões, mas aos poucos fui apurando a técnica, tornando-os cada vez mais leves, até que suas paredes ficaram finas como casquinhas.



Também passei a pintar minhas peças com engobe, sob orientação inicial da minha professora de cerâmica da EBA, que vinha de uma tradição nordestina e não tinha a menor relação com a tradição da cerâmica oriental, que é a que mais se vê nas exposiçoes, lojas e galerias, principalmente no Rio e São Paulo. Isto, hoje vejo com clareza, foi muito bom para mim, pois me deixou mais à vontade para experimentar e bem mais próximo das minhas raízes brasileiras (logo que deixei de me preocupar com temas oriundos da literatura de FC).



Seguem alguns exemplos deste importante momento de transição.

Anos 80 - Oficina de Cerâmica da EBA

"Castelo" - cerâmica esmaltada em baixa temperatura, altura: 30 cm, 1981. Este é um exemplo das peças cenográficas iniciais, as outras se perderam. Atualmente ela está decorando meu pequeno lago, onde crio carpas e outros peixes ornamentais.

"Caixa Babante" - cerâmica esmaltada em baixa temperatura, altura: 40 cm, 1982. Eis aí um exemplar bem curioso desta minha fase inicial.

"Criatura Orgânico-Mineral"- cerâmica, queimada em baixa temperatura, altura, 25 cm, 1981. Um estranho ser que parece ter sido retirado de um filme "B" de FC. Gosto muito desta peça.


"Troncos Alienígenas"- cerâmica esmaltada em baixa temperatura, altura: 22 cm, 1982. Na minha busca da forma entremeada com temas extravagantes, criei estas peças, modeladas a partir de placas de argila.


Como contei na postagem anterior, comecei a fazer cerâmica na Escola de Belas Artes, enquanto concluia meu bacharelado em Pintura. Durante quatro anos, tempo em que fiquei como monitor da oficina de cerâmica, auxiliando a professora junto aos alunos e fazendo as queimas, pude desenvolver muitos trabalhos próprios, aprendendo e experimentando bastante, especialmente em relação às técnicas de modelagem. Nesta ocasião criei muitas peças um tanto inusitadas, inspiradas em minhas fantasias sobre o futuro e histórias de FC (sobre a relação entre FC e meu trabalho de arte, leia postagens iniciais no meu outro blog: http://ricardarte.blogspot.com/ ). Infelizmente perdi várias das peças criadas nesta ocasião (durante uma limpeza no atelier, quando eu não era mais monitor, muitos dos meus trabalhos lá guardados foram levados por funcionários).


Tais peças não têm qualquer relação direta com a tradição da cerâmica, seja nacional ou estrangeira, sendo fruto apenas do meu desejo de dar concretude as minhas idéias fantasiosas. Em sua maioria foram modeladas com o uso da técnica dos roletes ou placas, biscoitadas e esmaltadas em baixa temperatura (900° C). Algumas são grandes, com mais de 40 cm de altura, outras têm até aspectos cenográficos.


Os exemplos postados darão uma idéia do que foi esta minha fase.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

A Minha Cerâmica

"Vaso Gordo" - cerâmica colorida com engobe e esmaltada, 1982. Este é um dos meus primeiros vasos e um dos raros esmaltados. Reparem como ele lembra aquelas figuras femininas primitivas, as "Vênus Esteatopígias", produzidas pelos artistas que viviam em cavernas. Contudo, quando fiz esta peça não tinha esta intenção.

Conjunto de "Vasos-Garrafa". Cerâmica colorida com engobe, 2005. A inspiração para a pintura destes vasos vem da arte africana.

"Conjunto de "Bonecas Cabeça-de-Pastel". Cerâmica colorida com engobe, anos 90. Comecei a fazer este tipo de boneca em 1988, quando buscava uma versão própria para as "Vênus" primitivas. Estas bonecas são muito simpáticas e versáteis.

"Escultura- Máscara". Escultura em cerâmica com aplicação de patina, 2005. Esta escultura é de um grupo peças inspiradas nas mais diversas fontes, especialmente na arte africana.

"Afrodite". Escultura em cerâmica sobre base de madeira, 2001/2. Outra versão pessoal para o tema das "Vênus" primitivas.


Sabe-se que a cerâmica é uma das mais antigas formas de arte entre as que produzimos até hoje. Suas origens se perdem num passado muito distante, quando ainda morávamos em cavernas e dávamos os primeiros passos rumo à civilização.

Pensar que faço parte desta linhagem de criadores, que descobriu como tornar um punhado de argila em uma peça utilitária ou numa estatueta da deusa da fertilidade, mexe com minha imaginação. Sinto-me ligado a este mundo tão incrivelmente distante e rústico, no qual fazíamos parte da Natureza de uma forma muito mais direta e profunda.

Não importa que meu forno seja elétrico, que meu barro, tintas e instrumentos sejam beneficiados industrialmente - eu sou um ceramista como aqueles primeiros, que mesmo sem ter qualquer noção do que viria a ser chamado de arte, a produziam através de seus vasos brutos, suas esculturas rudimentares, suas gamelas e urnas funerárias.

É exatamente este o aspecto da cerâmica que mais me atrai, o seu lado mais simples e rudimentar. Como todos poderão ver nas fotos postadas, meus vasos, máscaras e esculturas não primam pelos acabamentos sofisticados, esmaltes brilhantes, torneamentos impecáveis. Muito pelo contrário, são peças assimétricas, pintadas com argilas pigmentadas, exibindo desenhos e esgrafitos primitivos, texturas arenosas e rudes.

Através delas mergulho neste mundo primitivo, no qual busco minha inspiração, trazendo à tona os vestígios de um mundo perdido. Espero com isso tocar o sentimento e a imaginação de vocês, despertando-os para uma arte de inúmeras facetas, cujos cacos, por menores que sejam, são capazes de contar a história de uma civilização.

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Comecei a produzir cerâmica a partir de 1981, quando era aluno do Curso de Pintura da Escola de Belas Artes da UFRJ. Lá, inicialmente como aluno e depois como monitor da Oficina de Cerâmica, dei meus primeiros passos nesta arte (para conhecer minha história como artista plástico e minha relação com a EBA, visitem meu outro blog: http://ricardarte.blogspot.com/). Posteriormente, já formado e trabalhando com outros ceramistas fui aprimorando minha técnica e minha linguagem plástica, adicionando à cerâmica as minhas outras experiências artísticas no campo da pintura e da xilogravura (ver link mencionado). Hoje em dia continuo produzindo nos três campos, dividindo meu tempo entre estas formas de arte mas sempre procurando manter uma unidade entre elas. No campo da cerâmica também iniciei uma nova linha de trabalhos - os vasos para bonsai que podem ser vistos no blog: http://rpceramica-bonsai.blogspot.com/

Para ilustrar, seguem cinco imagens do meu trabalho como ceramista, feitos em épocas diversas: